Desejo introduzir essa mensagem com uma declaração feita pela Missionária Sophia Muller, pioneira da missão Novas Tribos do Brasil, no rio Içana, Amazônia, na década de 50.
Ela disse: “Jamais tive um chamado. Li uma ordem e obedeci.”
Confesso que ao ler essa declaração, me senti pequeno em meu mundo! Pequeno por vários motivos, mas principalmente por ver a clareza de entendimento que essa irmã tinha em relação à ordem dada por Deus, e sua obediência cega. E também, porque me vi emaranhado em minhas teorias e “conhecimento” do assunto, Missões.
Então parei para refletir sobre toda a questão que tão abertamente nos quer afastar da verdade única de Deus. Devemos ser neste momento, sinceros o bastante para reconhecermos que temos sido pródigos em elaborar as mais interessantes desculpas, com a intenção clara de omitir a nossa responsabilidade diante de Deus.
Desculpas tais como: “eu não tenho o chamado missionário”; “o chamado é específico para determinadas pessoas”; “eu tenho meu ministério”; e assim vai até não parar mais. Então descobri que eu, não só estou pecando por omissão, como estou em franca desobediência com Deus.
Missões, amados, não é uma simples questão de “chamado”, mas obrigatoriamente de “obediência”. Na ordem de valores, no coração do Senhor, “obediência” vem em primeiro lugar, mas para nós, “chamado” vem em primeiro lugar. E você sabe por que?
Porque chamado fala de “dom”, “galardão”, “prêmio”. Enquanto que “obediência”, fala de “renúncia”, “sacrifício” e “morte do EU”.
Não é por menos que Abraão entrou no rol dos heróis da fé, no livro de Hebreus. Porque ele não pensou duas vezes, ele ouviu a ordem e obedeceu, e só! Essa é a questão da nossa vida, amada igreja. Nós estamos em uma luta franca, não com o mundo, com o homem, com a carne, tão somente! Mas também, e principalmente, com Deus e Sua vontade.
Declaramos sem o menor problema que Deus é soberano sobre todas as coisas, até a hora que Ele resolve mexer conosco. Basta Deus começar a agir, apertando a nossa vida, trazendo provas e lutas, situações difíceis e palavras cobrando responsabilidade, santificação, etc., que logo a nossa mente é povoada de dúvidas e medos, e ai dizemos aos quatro cantos que estamos passando por tribulações, que o diabo está nos tentando, etc.
Então, onde está a nossa convicção de que Deus é soberano? E quando Ele “resolve” pedir um filho nosso para o Seu reino, disponibilizarmos os nossos recursos financeiros para a Sua obra, como fica a soberania de Deus?
Sou obrigado a dizer, com muita tristeza no coração, que a minha e a sua atitude, a minha e a sua vida, não condiz com tudo o que falamos. Nosso testemunho de vida está aquém daquilo que confessamos crer. É muito triste!
O Chamado
Quando afirmei que missões é uma questão de obediência, eu não estou negando a existência do chamado. Mas vale deixar claro o que realmente “é” o chamado, ou o que ele “não” é.O chamado, não é um privilégio de poucos, mas uma realidade de toda a Igreja de Cristo. O próprio nome Ekklesia (etimologicamente - Eklessía), que traduzido como Igreja, revela isso. Ekklesia é um termo composto de duas palavras: “Ek”, “para fora de” e “Klesia”, que é derivado de Kaleo (etimologicamente -Kalé_ô), o que quer dizer: “chamar”. O que significa dizer, que a Igreja pode ser entendida como: “chamada para fora de”.
O Pastor e Missionário Ronaldo Lidório diz em seu livro “Uma Igreja Visionária”, que uma Igreja visionária é aquela que traduz a sua teologia diante de uma realidade moderna. Uma Igreja que busca ser cheia do Espírito, mas tremendamente inconformada com o mundo, que vive os valores do Reino e aceita o desafio de ultrapassar barreiras para fazer o nome de Jesus conhecido entre todas as nações. Uma Igreja visionária, diz ele, é uma Igreja que põe as mãos no arado e ara a terra.
Nós temos a terra, temos o arado, temos as sementes, mas não temos muito tempo. É urgente que preparemos a terra e lancemos as sementes, pois o tempo das chuvas está chegando, e se não fizermos tudo a tempo, então perderemos toda aquela safra. Ora, se temos a terra e o arado, pare de sonhar com o futuro, viajando no tempo. Vamos arar!
A loucura do evangelho é a possibilidade de sermos, ao mesmo tempo, uma bênção para os de perto e para os de longe, e esta bênção somente será realidade, quando uma pessoa, uma família, uma igreja ou denominação se dispuser a transpor o abismo que separa o que se crê no nosso coração da prática na nossa vida.
Todos nós conhecemos bem o versículo chave da Bíblia? João 3:16 – “Porque Deus amou ao mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna”.
Este verso nos diz algumas coisas:
- diz que Deus Amou o mundo...
- esse Amor foi de tamanha magnitude, de uma maneira tal...
- que, em razão desse Amor sem medida, deu o Seu único Filho...
- a fim de que, todo e qualquer que vier a crer nEle, não passe mais pela morte, mas, possa viver para sempre.
É interessante, que nessa pequena declaração, pudemos enumerar quatro fatos, quatro declarações. Mas, o mais interessante, é que, apenas a última declaração é auto-explicativa, enquanto que as demais, não se explicam e dão margem a várias dúvidas! Por que será?
Acompanhe comigo:
- DEUS AMOU O MUNDO...
b. O mundo todo em que vivemos?
c. Parte do mundo em que vivemos?
d. Todo mundo da nossa cidade?
e. O mundo composto de todos os seres viventes?
f. O mundo composto apenas de seres humanos?
g. Todos os seres humanos?
h. Apenas uma parte?
i. E porque?
- DE TAL MANEIRA...
b. Se é de tal maneira, como medir?
c. Deus amou de um tempo da história pra cá?
d. Quando esse amor se manifestou?
e. Alguém em toda a história, já amou assim?
f. Por que motivo amou assim?
- QUE DEU O SEU FILHO UNIGÊNITO...
b. E o Filho, consentiu?
c. O Filho também amou?
d. Quando o Filho foi dado?
e. Por que Deus deu o Seu Filho?
f. Ele não poderia fazer diferente?
Como vemos nas três declarações acima, muitas perguntas podem ser geradas, e gerar muitas discussões, se olhadas fora do contexto bíblico. Diferentemente da última declaração que é por si só, conclusiva e auto explicativa: “para que todo aquele que nEle crer, não pereça mas tenha a vida eterna”. Ainda que você indague quem é aquele que crê, esta declaração simplesmente afirma que o fato, é que todo aquele que crer, será salvo. Isso é um fato inquestionável.
Percebam junto comigo, que Deus não gastou tempo explicando a Sua teologia. Ele não se preocupou em explicar, como e por que, as pessoas da Santíssima Trindade decidiram fazer todas as coisas, Sua doutrina de salvação, predestinação e soberania. A não ser uma coisa só: “A urgente necessidade de salvar o que se havia perdido”.
Sabem, temos nos perdido em teorias, em explicações e conhecimento, porque na verdade temos deixado de ver como Deus vê todas as coisas. A visão da igreja, não tem sido a visão de Deus.
A visão de Deus transpõe a visão da Igreja
Nossa teologia cristã deve centralizar Deus e os pensamentos de Deus. Ezequiel, perante o vale de ossos secos, foi impactado pela personalidade de Deus no verso 3 do capítulo 37 quando questionado: "Filho do homem, acaso poderão reviver estes ossos?".O que vemos é Deus entrando em diálogo com Ezequiel. E este é um momento em que os céus param. Quando o Deus Todo Poderoso, fita os olhos em um homem e entra em diálogo com ele. A pergunta de Deus a Ezequiel não é primariamente a respeito de ossos e vales, mas sim sobre a humanamente e insana possibilidade de ver o impossível acontecer.
E a resposta de Ezequiel, embriagado com a pessoa de Deus foi: "Senhor tu o sabes". Em outras palavras, ele estaria afirmando: Eu não tenho uma revelação sobre isto; não sei como acabará, não tenho poder para resolver e não posso me responsabilizar sobre o que isto acarretará, mas se o Senhor crê eu também creio que ressuscitarão.
A Missão da Igreja deve ser fundamentada na pessoa de Deus e dependência do que este Deus crê (a melhor palavra seria “diz” do verbo “dizer”). Enviar missionários, financiar Missões, treinar obreiros transculturais e espalhar o Evangelho até aos confins da terra é proposta de Deus. Parece-me que devemos trabalhar mais para obedecer e questionar menos Suas razões.
A Visão de Deus limita a autoridade da Igreja
Paulo, por várias vezes enfatizou que há para a Igreja uma promessa de capacitação espiritual, de revestimento de autoridade e poder espiritual. Entretanto qual é o limite desta autoridade?
Creio que em sua teologia Paulo respondeu que a autoridade espiritual do crente está limitada pela visão, vontade e prioridade do Senhor. Somos revestidos de autoridade apenas para fazer aquilo que o nosso Deus deseja, não para satisfazer nosso ego, luxúrias, carnalidades e desejos pessoais. É fácil confundir capacidade espiritual com prosperidade; contudo é preciso entender que a capacitação espiritual não isenta o crente das provações.Vejamos a experiência de Paulo quando, saindo de Antioquia, realizava a vontade de Deus.
- Em sua primeira viagem missionária ele experimenta uma tempestade que quase o mata; mas segue em frente na autoridade do Senhor.
- Na Segunda viagem ele deseja seguir para a Ásia, mas Deus o envia para a Europa, e ele se dobra em submissão ao Senhor.
- Em Filipos é açoitado em praça pública, trancado em uma prisão, mas à meia noite ele testemunha louvando ao Senhor.
- Em Tessalônica é perseguido.
- Parte para Beréia onde é severamente ameaçado.
- Chega em Atenas e o chamam de tagarela.
- Vai para Corinto e o acusam no tribunal como impostor.
- Já mais velho, na terceira viagem missionária recolhe ofertas para ajudar os irmãos na Judéia. Mas chegando a Jerusalém o povo o esperava com cadeias e prisões e não com as honras do apostolado.
- Acusado pelos próprios Judeus apela para Roma, pois ali Deus o queria. Mas não vai como missionário, mas sim como prisioneiro.
- Mesmo fazendo a vontade de Deus, a viagem foi trágica. Durante 14 dias o navio foi açoitado por uma terrível tempestade.
- Náufrago na Ilha de Malta foi picado por uma víbora que quase o matou.
- Chegando finalmente a Roma, considera-se na verdade prisioneiro de Cristo e não de César, afirma que morrer é lucro.
- Suporta prisões, difamações, fome, perigo, tempestades, frios, desertos, solidão, mas persevera na obra para a qual fora chamado. Um homem revestido da autoridade do Senhor para perseverar na visão do Senhor.
A visão de Deus mostra o caminho a seguir
Você já parou para pensar o que fez o Evangelho sair de Jerusalém e alcançar os confins da terra? O que fez a Igreja ver o que Deus vê? O que fez o povo de Deus trocar vida, bens e posses pela expansão do Reino do Senhor? O que fez os cristãos do primeiro século escreverem com seu sangue: "Não sou eu quem vive, mas Cristo que vive em mim?”.Lendo o livro de Atos com os olhos humanos, encharcados dos critérios simplistas que definem sucesso e fracasso em nossa geração, sim porque, sempre olhamos para o grande sucesso das mais de 8.000 almas alcançadas em tão pouco tempo, mas não vemos um grupo de pessoas pagando preço por isto, um preço alto demais através do sofrimento, da tristeza e da dispersão.
Assim sendo é necessário entender que nem toda visão de um homem de Deus é necessariamente visão de Deus. E nem toda visão da Igreja de Deus é necessariamente visão de Deus. Somente a visão do Senhor mostra o caminho que devemos percorrer. Dependemos do Senhor.
Conclusão
Nossa visão de igreja está embaçada pelas coisas que marcam o sucesso ou o fracasso. Se, temos uma igreja grande, se temos recursos em caixa ou se temos pastores influentes, então somos respeitados. Agora, se após anos e anos, permanecemos pequenos, em dificuldades financeiras e nossos pastores são simples, então essa igreja tem problema!Que tem problema não se discute, porque afinal, toda árvore plantada junto a ribeiros de águas, têm que crescer e dar frutos a tempo e fora de tempo. Mas a verdade é que estamos perdidos em nossa visão de igreja, estamos centrados em nossos pequenos problemas e não estamos dispostos a obedecer cegamente à voz de Deus.
Alguns teólogos do Século XIX olhavam para a vida de Jesus e pensavam: “Ele fracassou”. George Strauss no fim do Século XIX zomba dizendo: “Ele não tinha poder. Seus amigos morreram sós, abandonados, traídos e em sofrimento. Morreram sem glória”.
Straus, apesar de irônico e liberal, acertou em sua última afirmação: “Morreram sem glória”. A minha e a sua vida possuem um propósito maior debaixo dos céus que é a glória do nosso Deus e mesmo a nossa aparente glória humana deve visar uma só coisa em nossa existência: lançá-la aos pés de Jesus. É privilégio da Igreja de Cristo se desglorificar-se para exaltar e glorificar a Deus. Para que isto aconteça são necessárias duas coisas: Obedecer cegamente toda a Palavra de Deus e Sua vontade. E, reaprender a olhar o mundo e vê-lo com a visão de Deus.
Gloria ao Excelso Deus.
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